O livro de Sónia Borges sobre o bairro de Santa Filomena, que em boa hora a Princípia decidiu publicar, com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian (FCG), constitui um importante testemunho de uma realidade muitas vezes escondida. Estas páginas trazemnos, de facto, verdades difíceis.
Pela pena da Sónia, percorremos as suas ruas, por vezes lamacentas, assistimos: à transformação das habitações de precárias em definitivas; ao aparecimento dos lugares públicos e de apoio à comunidade; aos efeitos desestruturadores das representações racistas que vêm de fora, sobre as pessoas e as suas culturas; às manifestações de identidade presentes num penteado ou numa veste; à tensão trazida pelo cerco policial imposto às suas gentes; ao papel educador e ecumenizante desempenhado pelas crianças.
A recriação da realidade em movimento que esta narrativa nos traz tornouse possível porque a autora, rompendo com o seu estatuto de técnica de um projeto, de profissional neutra e isenta, se assumiu como pessoa na relação com os habitantes do bairro. Abriuse aos outros, acertou o seu ritmo e os seus tempos pelo dos outros, simetrizouse com quem interagia, numa palavra, tornouse vizinha